Mostrar mensagens com a etiqueta 1923. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta 1923. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 27 de março de 2019

«S. Christovão»




«Mas não poremos ponto sem adicionar umas pequenas notas coligidas numa segunda visita a Ruivães: 
(…) 
O que ainda existe são evidentes vesdtígios de uma povoação no sítio denominado de S. Christóvão. É um pequeno outeiro, d’onde a vista se delicia num vasto horizonte, cheio de verdura e de luz. 
Caminhando para S. Christóvão, acompanhados do ilustrado parocho sr. P.e José António Fernandes Pereira, e do professor sr. Motta, os nossos olhos a cada passo lobrigavam bocados de tijolo, evidente signal de ter por alli vivido gente. Por alli, ou por perto, devia passar a estrada romana; que muito que a gente de então, romana ou lusitana, erguesse alli casas? A gente de então em alguma parte havia de viver, mesmo para fugir aos lobos.
Mas deixemos a sciencia aos sábios e oiçamos o que nos dizem os nossos ilustrados ciceroni.
No alto do dito local de S. Christovão, surgem-nos de chofre vestígios quasi apagados de uma civilização extincta, que teve os seus alicerces na Cruz. Foi alli – é a tradição – a antiga egreja parochial de Ruivães. No cume de uma penedia que emergia no centro do local, abriu-se uma cavidade, onde se enterrou a Cruz amiga e salvadora, a apontar para o Céu. A esse Calvario subia-se pela mesma penedia, a que se teriam aposto toscos degraus.
Logo adeante ficaria a egreja. Lá vemos ainda, escalonadas pelos muros das tapadas, algumas pedras lavradas. Há uma que parece ter sido a pia batismal. E ninguém fez caso d’aquillo. Os governos d’este pobre paiz, que pensam em tudo e não pensam em nada, os politicantes de má morte, estão à espera de que algum cabreiro boçal dê cabo da ultima pedra lavrada, do último vestígio de uma civilização que foi. Porque, saiba-se de tudo, muitos dos vivos ainda se lembram de haver no local mais pedras do que há hoje.
Mas a maravilha maxima do sitio são os chamados túmulos de S. Christovão, de que aliás já fala o nosso informador sr. A. C. A meio de um caminho, salvas de um vandalismo por milagre, estão duas pedras escavadas à maneira de tumulo, e com circunstancia de se estreitarem no sitio onde deviam encaixar os hombros e a cabeça do defuncto. Seriam túmulos árabes? Seriam túmulos christãos? É diffícil averigua-lo. Os sábios que por aqui andaram – Martins Sarmento, M. Capella, etc., - não sabemos em que sentido se pronunciaram. Alguns accrescentaram que eram túmulos de gente; e que eram de gentegrande, embora os túmulos sejam medianos; e aventam a hypothese de que quebrassem as pernas aos defunctos para eles caberem. Se a versão assenta em base histórica, desde já podemos garantir para a posteridade que os túmulos não eram de portuguezes; por mui pouco civilizado que um povo seja, há de respeitar os mortos. Aliás é selvagem.
Subam a S. Chistovão os sete sábios do mundo moderno – e tivesse elle sete! – e deslindem o tremendo mysterio.»

Retirado do livro «Vieira do Minho: Noticia historica e descriptiva» do Padre José Carlos Alves Vieira. Edição do Hospital "João da Torre". Ano: 1923.