domingo, 16 de outubro de 2016

«Os resistentes de Ruivães»


Em tempos idos, podíamos ver nalguns estabelecimentos um cartaz onde se reproduzia um cavalo a galope e uma máxima que dizia: 
“O tempo, passa a galope. Não o percas, nem o faças perder”.
Nós, não nos apercebemos da importância que o tempo tem na nossa vida. Ouvimos com frequência afirmações como “já passou tanto tempo!...”. Ou “Isso, foi no tempo da outra senhora”! Ou ainda “no tempo dos afonsinos…”. 
Hoje, o tempo divide-se em duas partes; “antes do 25 de Abril” e “depois do 25 de Abril”, ou também “no tempo da ditadura” e “já no tempo da democracia”.

Enfim! Temos mesmo de admitir, que o tempo comanda a nossa vida. Tivemos um tempo para nascer, um tempo para viver, e teremos um dia… tempo para morrer. 
Eu penso muitas vezes nisso, em alturas que o meu cérebro me pede uma pausa. 
Refugio-me num local isolado, vou divagando até que algo me desperte fazendo um balanço do que tem sido a minha vida. Penso no que já vivi, e tento adivinhar - sem o conseguir, claro – o que me falta viver. 
Tenho nos meus antepassados muitos casos de quase centenários, a minha família é toda natural do Alto-Minho, e foi então que uma notícia no jornal me veio dar mais esperança de vida. 
De acordo com um artigo no jornal “Correio da Manhã” de 1 deste mês de Outubro de 2016, e baseado em informação dada na véspera pelo Instituto Nacional de Estatística: «Um português vive em média 80,41 anos». É este o valor da esperança de vida à nascença para o total da população, relativo ao triénio 2013-2015». 
Mas há mais! Segundo essa informação; «Dividindo o país por 25 sub-regiões, o destaque vai para o “Cávado” e “Ave” (região norte), e “Alto-Minho”, com 81,19 anos, os valores mais altos entre os portugueses das outras regiões». E esta, hem ?... 
Assim, meus caros conterrâneos, tenham esperança de vida prolongada, pois a nossa região Cávado/Ave/Alto-Minho bate recordes e todos nós chegaremos a velhinhos!... 
De facto, constato (particularmente em Ruivães porque esta vila me diz muito), que aqui podemos encontrar um grande número de pessoas octogenárias, nonagenárias e quase centenárias, transpirando saúde física e mental, o que ocasiona a que ninguém adivinhe a idade de cada um. 
Eu vivo numa grande metrópole, onde o modo de vida (sedentária quanto baste) dos citadinos, provoca um muito baixo índice de idosos. É ver (e de lamentar) jovens na “casa dos vintes” com problemas cardíacos por falta de exercício físico. 
A idade da mortalidade, ronda pouco mais que metade da que as estatísticas agora apresentadas atribuem para o Portugal profundo, o seu interior, onde nos incluímos com alegria, por sermos mais duradoiros. 
Em Ruivães”– especificamente – vi octogenários dotados de grande vigor executando tarefas que muito cansariam jovens nas grandes urbes. 
Exemplo disso, um dia durante uma caminhada pela zona de São Cristóvão, cruzei-me com uma ancião que de sachola em punho “limpava umas bordas”. 
Cumprimentei-o, e para meu espanto disse-me estar perto dos noventa anos, e mais me espantou quando me disse: 
-Eu conheço-o. Você, é dos do Latoeiro, neto do Tio João. E o seu pai, era o César, não era? Conheci-o muito bem. Um bom homem!… 
Meu pai, morreu em 1954, tinha eu nove anos. Que memória a daquele homem! 
O mais incrível, é que ele ainda é vivo, é conhecido pelo “João do Amaro”, da Quintã. Encontra-se internado no Lar de Ruivães, lúcido quanto baste. 
Como ele, outros casos de longevidade há na nossa vila, que me deixam “embasbacado”, pois muitos deles, quando ali fui criança já eles eram adultos. 
Podia enumerar bastantes, mas para não abusar do espaço dou alguns exemplos. 
Temos o Pedro Campos, com um passado ligado à própria história de Ruivães, pois sempre o vimos envolvido nos acontecimentos que na vila se viveram ao longo de muitas décadas. É um daqueles homens que fazem parte da mobília de Ruivães. 
Quem o presenciar e o não conheça, jamais lhe dará os noventa e alguns anos mais que reza o seu B.I. 
E… por este andar vamos festejar o seu centenário, e nessa altura haverá festa em Ruivães. Continua assim bom amigo. 
Outros personagens que preenchem o dia a dia de Ruivães, e com historial idêntico ao do Pedro, como por exemplo o Amílcar Machado, o António Campos, o António Zé do Pinto, o Zé do Ferreiro etc. etc., homens para quem o tempo não passa, eles é que passam por ele. 
São verdadeiros resistentes, e ou Deus se esqueceu deles cá na terra, ou lhes atribuiu em segredo a missão de nos fomentarem esperança de vida. Se assim foi, deixem-se estar por cá muitos e bons anos mais para nossa felicidade. 
Não podemos esquecer outros resistentes “que desta vida se partiram”, e que continuam a preencher a nossa memória, mas um dia nos encontraremos todos lá em cima, para dar continuidade às “suecadas” e “biscas de nove” como forma de “matar o tempo”. 
Bem hajam, RESISTENTES DE RUIVÃES.
Manuel Joaquim F. de Barros
2016-10-13


http://www.jornaldevieira.com/noticias.asp?idart=12805

1 comentário:

Anónimo disse...

Gosto sempre de ler os textos evocativos do Sr. Manuel Joaquim Fernandes de Barros.
Quanto a este, já o tinha lido no Jornal de Vieira mas, relendo-o agora, apreendo novas nuances e aprecio novos sabores de cariz humana e histórico-etnográfico.
É também desta forma que se vai escrevendo a história desta e de todas as localidades.
Ruivanense Adoptivo